Por Eduardo Caputo
Pesquisador associado - Universidade Brown, EUA
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Não é de hoje que o gaúcho se vangloria de lidar bem com o frio, em especial quando conversa com alguém que mora em outra parte do Brasil. Claro, afinal, no Rio Grande do Sul, o estado mais ao sul do País, faz muito frio. Basta que o primeiro frio apareça para escutarmos frases do tipo: "deu uma esfriada, até tive que colocar uma camisa de manga". Lembro que alguns anos atrás, quando os conteúdos eram compartilhados por e-mail. Sim, jovens, houve um tempo onde tudo na internet era mato, e o aplicativo de mensagens instantâneas nos celulares como conhecemos hoje, não existiam. Nessa época, rolou um texto onde se comparavam populações de vários estados, com os gaúchos, em diferentes fases de frio. Onde a vida chegaria se extinguir, em casos de frio extremos, em alguns locais, enquanto nós gaúchos permanecíamos tranquilos!

Há alguns anos fui comprar uma cuia nova em uma loja de artigos gaúchos. Também houve um tempo, jovens, onde todas as cuias eram de porongo ,e eventualmente, era necessário reposição. Ainda estava um clima ameno, era outono acho. Entrei na loja e logo de cara fui abordado por um vendedor. Poucas palavras e segundos depois já estava à frente de várias opções de cuia. Foi nesse momento importante que iria definir o instrumento usado pelo gaúcho para cevar seu mate, que o vendedor intervém e comenta: "Coisa boa que está chegando o frio. Eu chego a sair de casa de manhã cedo sem camisa só pra sentir bem o frio". Olhei com certa descrença para o amigo vendedor, mas balancei a cabeça de forma positiva. Escolhi a cuia, paguei e segui meu rumo.

Enquanto as temperaturas no Brasil começam a aumentar, o inverno se aproxima no hemisfério Norte. Já é possível experenciar temperaturas próximas de zero, e se engana quem acha que para por aí. Logo que cheguei aqui, em um dos primeiros finais de semana de fevereiro, as temperaturas baixaram muito, chegando a -20ºC (ou -4ºF). Sim, os americanos usam o Fahrenheit, aquela unidade de medida que todo mundo aprende no colégio e acha que nunca vai usar na vida. Recordo que nesse final de semana, apesar de ter trabalhado de casa, precisei sair rapidamente. Meu destino ficava duas quadras da minha casa, na época. Na rua, marcava algo em torno de -10ºC. Além das roupas normais de inverno, eu ainda vestia touca, manta (ou cachecol, se você preferir) e luvas, e mesmo assim tinha a impressão de que estava de bermuda e camiseta.

Claro que por aqui há toda uma estrutura para suportar o frio. E, em tese, se sente frio somente na rua, tendo em vista que em locais fechados sempre há climatização. Ainda, em situações como essa, os responsáveis pelos imóveis devem tomar algumas medidas importantes. Em geral, em casos extremos como esse, as pessoas são instruídas a sair de casa o mínimo possível, a manter as torneiras abertas e dar descargas com frequência, tendo em vista a possibilidade de congelamento dos canos. Acho que nem nós gaúchos, estamos totalmente preparados pra enfrentar esse frio extremo que o Norte apresenta, com uma camisa de manga e um mate quente, em especial sem ter aquecimento dentro de casa. Acredito que, com essas temperaturas, o caro amigo vendedor não se arriscaria a "sentir bem o frio".